Por Ana Soares
A emoção, os sentimentos e a paranoia na política são o filão do pensamento do psiquiatra e psicanalista Valton Miranda, Doutor Honoris Causa da Universidade Federal do Ceará (UFC) e autor de dois livros sobre a passionalidade no debate ideológico. Com mais de 20 anos de observação e pesquisa, ele constata: “do ponto de vista ético, o ódio na política é condenável; mas, na prática, é inevitável”.
A lógica de Miranda é mais ou menos simples: na busca por convencer os outros de seus argumentos e arregimentar mais aliados, o indivíduo precisa de força, seja ela política, financeira ou retórica. É nesta última onde entra o fator emocional: “não há como você usar sua força de persuasão sem doses de agressividade”, define.
Talvez isso explique por que, em comícios e debates, gritos, brados e batidas na mesa sejam tão comuns – mesmo quando há microfones, alto-falantes e todo um aparato sonoro que dispensaria a elevação do tom.
Mas, apesar de tratar uma certa dose de hostilidade como componente fundamental da briga pelo poder, o psicanalista pondera que há diferenças entre ser agressivo e ser destrutivo. “Eu posso ter um adversário político e manter uma relação de confronto no plano das ideias. Para isso, se exige de mim que eu seja um político amadurecido, que não deixe a discussão cair no plano pessoal”, explica Miranda, ao reconhecer que a medida dessa fórmula é imprecisa e delicada.
Além da maturidade, pesariam a favor do equilíbrio a própria personalidade do ator, seus valores culturais e as características do grupo ao qual ele pertence. Quando esses fatores inexistem, surge algo fundamental na tese do pesquisador: a paranoia.
Inimigo pessoal
Tratada pelo psicanalista como o “motor da política” brasileira, a paranoia acontece quando o indivíduo vê o adversário não apenas como oponente, mas como inimigo, que está em constante conspiração. “A política se organiza entre uma base paranóica e outra mais racional, argumentativa e estruturada. O funcionamento gira em torno dessa oscilação”, explica.