O
atentado terrorista contra uma revista de humor em Paris, a Charlie Hebdo,
levanta uma bandeira universal a favor da liberdade de expressão, além de
encontrar um inimigo público comum para a liberdade de imprensa – ou dois
inimigos: o terrorismo e o fanatismo religioso. Comumente, expressam-se de
maneira uniforme, sendo quase indissociáveis.
“Je suis Charlie”, é o slogan
pós-moderno correspondente às palavras de ordem da Revolução Francesa: “liberte,
égalité, fraternité”. O ataque matou 12 pessoas e motivou a edição
extraordinária de número 88 do Boletim Eletrônico da Federação Nacional dos
Jornalistas Brasileiros (FENAJ), que condena e lamenta o ocorrido. Na verdade,
inúmeras autoridades estatais e representantes de organizações defensoras dos
direitos humanos emitiram declarações, já que o ato materializa uma comoção
generalizada e representa outros mártires menos ilustres, como o repórter Sean
Hoare. Suspeita-se que sua morte tenha ligação com sua profissão, embora a
hipótese tenha sido descartada pela polícia. Sem falar dos jornalistas mortos
pelo Estado Islâmico...
Mas o que tem sido chamado de “11 de
setembro da imprensa” apenas demonstra de maneira brutal a violência contra
o jornalismo e os jornalistas, em suas várias formas de expressão. E diferentemente
de outras profissões de risco, como policiais, agentes de saúde, pilotos,
políticos (!), a estes profissionais da liberdade não é outorgada prerrogativa
alguma, exceto a da fantasia glamorosa do destemor e audácia. Interessante
perceber que a faceta à paisana de alguns heróis das histórias em quadrinhos
(HQ’s) seja a de jornalista: Super-Homem é o repórter Clark Kent; o Homem
Aranha é o fotógrafo Peter Parker. Um arquétipo do homem normal que incorpora o
“Complexo de Clark Kent” e todas as desvantagens do herói...
Proteção dos jornalistas x "democracia de riscos"
A profissão de jornalismo implica algumas
premissas, como a ligação do jornalista com a democracia. Claro que o
jornalismo depende de liberdade e de outras condições, reportando-se a um
público virtual – a sociedade civil. Estabelece-se, então, a comparação do
jornalista com o homem público, político, mandatário da confiança popular e,
até certo ponto, representante dessa opinião pública.
Como mecanismos de regulação da profissão e
consequente proteção do jornalista, poderíamos elencar, com participação
estatal, a regulamentação governamental das liberdades de comunicação e
expressão, a proteção dos direitos e da reputação das pessoas, a proteção da
segurança nacional, da ordem pública e da salubridade ou moral públicas, bem
como promoção de maior exatidão da informação.
Intrigante é observar que inexistem
garantias ao agente profissional do jornalismo – o jornalista. Apenas debate-se
do ponto de vista estrutural externo, não se pensando a responsabilidade do próprio
jornalista, posto na condição de “demagogo”, espécie de classe de “párias”,
sem classificação social precisa (Weber). Mesmo essa responsabilidade terá que
ser compreendida estruturalmente, sim, mas a partir das possibilidades reais.
Sem trocadilhos infames com as terríveis
perdas humanas, “a vida do jornalista, entretanto, está entregue, sob todos
os pontos de vista, ao puro azar e em condições que o põem à prova de maneira
quem não encontra paralelo em nenhuma outra profissão” (Weber).