Sei mais coisas sobre a vida de
Roberto Carlos do que jamais me interessei em conhecer, e a coisa mais
importante que sei, de fato, é que a fama lhe subiu à cabeça, e que ele é
chato. Tudo isso, é claro, porque ele assim quis.
Quando
escolhemos nos expor estamos automaticamente, e por vezes de maneira talvez
inconsequente e irracional, escolhendo abrir mão de certas liberdades. Uma
delas, a privacidade. Quem não gostaria de ser conhecido e lembrado somente por
seus nobres atributos? Todos nós, é claro, inclusive eu. Atenta a esse fato,
sou daquelas que gosta de tudo que contém as letras do alfabeto; bula de
remédio, manual de instruções, chapa de caminhão; leio com a mesma voracidade
as Meditações de
Descartes e a última National Enquirer ou a Caras local. Tenho uma necessidade
fisiológica de "conhecer" o outro, pois só assim consigo sentir
"conforto" em aceitar quem eu sou, com todos aqueles outros
atributos, não tão nobres que carrego comigo. Curiosamente, Roberto Carlos
nunca tinha despertado minha curiosidade, muito menos a curiosidade por coisas
que devem ser mantidas em "sigilo". Hoje conheço boa parte delas,
bastou dar um google em todas aquelas palavrinhas chaves associadas ao seu
nome.
Antes
de suas Confissões, Santo
Agostinho foi um grande baladeiro, Platão gostava de meninos, Elvis, contam,
morreu sentado na sua privada, Agassi revelou que quase perdeu sua peruca
durante uma partida de tênis, Eric Clapton afirmou não gostar de Lennon,
Michael, esse sim o verdadeiro rei, dizem, tentou ser branco, Lady Di
escancarou sua anorexia, Kennedy era adúltero, e todos tiveram ou têm em comum
serem Humanos, Demasiadamente Humanos, como diria Nietzsche.
Greta Garbo disse "quero ficar só", o ex-presidente
Figueiredo solicitou que "me esqueçam". Foram tentativas honestas de
quem estava cansado da vida pública, mas a vida pública não tem volta. Ao se
optar por esse caminho, a pessoa tem que entender que é um compromisso,
"para o bem, ou para o mal". Até quando a igreja escolhe canonizar
seres terrestres coloca os mesmos sob um "fogo cruzado" dos mais
rígidos até autorizar a canonização, e, mesmo assim, nem sempre a decisão é
unânime.
Recentemente li uma entrevista de Mia Farrow para a Vanity Fair,
em que ela revelava que "possivelmente" seu filho com Woody Allen é
na verdade de Frank Sinatra. Nesta mesma entrevista ela responsabiliza o já
quase santo Papa João Paulo II por não ter interferido nos massacres na
católica África Central. Ninguém está imune ao escrutínio público, muito menos
aqueles que desejam ser publicamente ouvidos e reverenciados. Se quero ser
ouvido, tenho que também ter a capacidade de me manter lúcido quando ouvir ou
ler algo sobre mim que eu não desejava que lá estivesse sendo dito. Só existe
uma maneira de mantermos o anonimato, e esta maneira é básica: sermos anônimos.
Tenho acompanhado o movimento de alguns artistas, entre eles
Roberto, o que mais aparece e se expõe quando o assunto é biografias, e escuto
que desejam poder ter o controle absoluto daquilo que deles é ou será dito.
Entendo seus receios, inclusive me solidarizo com os anseios pessoais, mas,
infelizmente, há muito eles abriram mão deste direito, quando voluntariamente
optaram por expor ao mundo quem são, e, principalmente, como pensam.
Dizer que a vida pública caminha em paralelo à vida privada é
incoerente, e deixo aqui uma curiosidade para reflexão. É bem provável que se
Adolph Hitler tivesse conseguido se provar no mundo das artes, como desejava, a
história da humanidade teria sido diferente.
