Quem dirige um governo, assume responsabilidades por inteiro e por toda a
sua administração.
Quem é investido de autoridade está permanentemente assumindo
responsabilidades. A responsabilidade sempre define um foco individualizado, de
quem serão cobrados resultados. Sobretudo num regime presidencial como o que
temos no Brasil, a responsabilidade, em última análise, adere ao governante
máximo, na esfera respectiva de governo.
A responsabilidade define um foco individualizado, de quem serão cobrados
resultados
Ao escolher seus
auxiliares e delegar poderes a eles, o chefe do governo não se livra da
responsabilidade política e administrativa, já que ele foi o responsável pela
escolha e nomeação deles. Mesmo uma falha setorial, claramente atribuível a um
auxiliar, será também imputável ao governante.
Talvez não lhe
seja imputada a falha específica. Certamente lhe será cobrada a falta de
critério na escolha do auxiliar, ou nos poderes que lhe delegou. Esta é uma
razão que justifica porque insistimos tanto na necessidade da supervisão do
chefe sobre sua administração.
Mas os problemas
da relação entre responsabilidade e poder não se limitam às situações de falha
e erro na administração. A questão possui maior complexidade. Como a
responsabilidade se individualiza, quem a assume deve se assegurar
antecipadamente de que possui o comando dos meios para executá-la a contento.
No meio militar há
uma expressão que define com precisão esta regra: "Quem dá a missão, dá os
meios". Assumir uma responsabilidade, sem contar com os meios que permitam
dela se desincumbir satisfatoriamente, é cortejar o desastre. Sem os meios
necessários e suficientes para cumpri-la, o resultado é o insucesso certo.
Este insucesso,
por sua vez, "gruda" na pessoa que recebera a responsabilidade pela
realização da tarefa ou missão, de nada lhe adiantando reclamar depois que não
dispunha dos meios para dela se desincumbir. Por meios deve se entender todos
os recursos necessários para executar a tarefa:
Jurídicos, econômicos, políticos, técnicos, pessoal, tempo, cooperação dos setores envolvidos, etc.
Jurídicos, econômicos, políticos, técnicos, pessoal, tempo, cooperação dos setores envolvidos, etc.
Portanto, é uma
medida de prudência política exigir, de quem lhe atribui a tarefa e a responsabilidade
por ela, todos os meios que você avalia serem necessários para torná-la
realidade. Mais ainda, você deve inclusive buscar uma "folga extra"
nos meios que lhe serão viabilizados, para cobrir as eventualidades não
previstas, e as falhas de planejamento.
Se esta
lei é tão óbvia, porque é tão comum incorrer-se neste erro?
Recursos previstos podem não estar disponíveis na quantidade e no momento em
que são necessários
A frequência com
que se comete este erro se explica pela própria natureza dinâmica da política.
Em primeiro lugar, há que levar em conta que, muitas vezes, as
expectativas sociais em torno de um projeto ou ação de governo crescem além dos
limites do razoável, e muito além dos meios alocados para realizá-los. Se isto
ocorrer, e o governante não agir no sentido de redefinir a meta ou alocar o
extra de recursos necessários para realizá-la, a armadilha está armada.
Em segundo lugar, porque os recursos previstos podem não
estar disponíveis na quantidade e no momento em que são necessários. Há sempre
um imponderável e vários imprevisíveis na política e no governo.
As decisões são
tomadas e os recursos são previstos na programação administrativa e
orçamentária, mas isto não assegura muitas vezes a sua tempestiva liberação.
Não é incomum que, diante de fatos novos, urgentes e inesperados, os meios
tenham que atender a emergência, comprometendo aquela previsão inicial que não
mais poderá ser cumprida.
Em terceiro lugar, na política as atividades não conseguem ser
quantificadas de forma detalhada, como sucede, por exemplo, numa decisão
econômica de investimento. Erros na avaliação dos recursos necessários são frequentes.
Se o erro for para menos, novamente a armadilha está armada.
Em quarto lugar, a atribuição de uma responsabilidade tende
a ser cumulativa. De maneira quase imperceptível, no dia-a-dia de uma
administração, a responsabilidade inicial costuma ser acrescida de outras, que
com ela estão muito intimamente relacionadas. Desta forma, a pessoa que recebeu
a tarefa, somente mais tarde vai perceber que à responsabilidade inicial se
agregaram outras, compondo um compromisso para o qual não havia se preparado,
e, com relação ao qual faltam-lhe os meios para executar.
Há várias outras
razões que explicam a frequência com que esta lei é desrespeitada na dinâmica
da vida política e de governo. A atividade política é muito dinâmica, a todo o
momento ocorrem mudanças que alteram planejamentos já feitos, os compromissos
tendem a ser definidos e assumidos verbalmente, e o conteúdo das
responsabilidades nem sempre é determinado de maneira precisa. Há
inevitavelmente muito de imprecisão, subjetividade e incerteza na atividade
política. São estes fatores que podem, a qualquer momento, alterar a balança de
responsabilidade/poder, e produzir aquela armadilha.
Você deverá sempre
estar atento a esta balança, ao necessário equilíbrio que deve existir entre a
responsabilidade assumida e os poderes necessários para executá-la.
Nunca permita que
estes dois pólos fiquem demasiadamente afastados um do outro. Desincumba-se de
sua responsabilidade com a atenção focada neles. Ao sinal de que vão lhe faltar
os meios, você deve, ou tentar a suplementação adicional, ou redefinir para
menos a responsabilidade assumida.
Francisco Ferraz