A arte de triangular consiste em “roubar” parte da agenda do seu
adversário e incorporá-la em seu discurso político
Um dos princípios da comunicação política é o contraste. Isto é, sua
mensagem em uma campanha eleitoral - ou mesmo no exercício de um mandato - deve
deixar claro para os eleitores no que sua candidatura se diferencia das outras
candidaturas, e mostrar porque a sua candidatura é a melhor.
Buscar o contraste, entretanto, não significa necessariamente uma
estratégia de embate com tudo o que o seu adversário defende ou propõe. O
debate eleitoral não é um “choque” entre dois projetos que tentam provar sua
superioridade um sobre o outro, mas sim a busca de uma conexão mais eficiente
entre o candidato e o eleitor. Em outras palavras, uma aproximação com o senso
comum do eleitor.
Por isso, em algumas circunstâncias, a estratégia da triangulação pode
ser uma eficiente opção para se chegar à vitória em uma batalha eleitoral.
Basicamente, a arte de triangular consiste em “roubar” uma parte da agenda do
seu adversário e incorporá-la em seu discurso político.
Dick Morris, um dos consultores políticos de Bill Clinton, define a
estratégia da triangulação como trabalhar arduamente para resolver os problemas
que motivam os eleitores do outro partido. Segundo Morris, quando você resolve
os problemas que mantém o outro lado ativo, você leva seu adversário a falência.
Quando George Bush (o filho) em sua primeira campanha presidencial criou
a o “conservadorismo compadecido” (ou “republicanismo com compaixão”) ele
conseguiu com sucesso amenizar o problema da “frieza social” que pesava sobre a
imagem dos republicanos, dialogando com uma parcela importante de eleitores que
simpatizavam com as políticas sociais dos democratas. Se Bush triangulou pela
“esquerda”, Tony Blair fez a mesma operação pela “direita”, prometendo em sua
campanha reduzir o poder dos sindicatos e manter alguns pilares da política
liberalizante da era Thatcher. O alvo de Blair era reduzir o medo, presente em
uma parcela do eleitorado de centro, do radicalismo de setores sindicais do
trabalhismo inglês.
A relação mal-resolvida da campanha presidencial de Alckmin com o Bolsa
Família expôs a falta de clareza, em sua estratégia, de quando é necessário
triangular. O candidato do PSDB oscilou críticas ao caráter “assistencialista”
das políticas sociais de Lula no começo da campanha, com a promessa posterior
de manter o Bolsa Família. Evidentemente, agindo assim ele mesmo minou a
credibilidade de seu compromisso. Tentar atacar numa campanha uma política com
alta aprovação popular é um grave erro estratégico. Não se muda o senso comum
dos eleitores no espaço de uma campanha eleitoral. Sua única saída é ou
incorporar essas políticas em seu discurso, ou diminuir ao máximo sua
importância na agenda da eleição.
Tony Blair prometeu em sua campanha reduzir o poder dos sindicatos e manter alguns
pilares da política liberalizante da era Thatcher
Esse, por exemplo, foi o impasse estratégico que paralisou Lula em 1994,
diante do sucesso do Real. Sem poder criticar um plano econômico com alta
popularidade, mas ao mesmo tempo com medo de elogiá-lo e fortalecer seu
adversário, Lula, que tinha mais de 50% das intenções de voto a quatro meses da
eleição, acabou derrotado em primeiro turno.
Mas a arte de triangular exige cuidados. Em primeiro lugar, é preciso
dar credibilidade ao seu compromisso com bandeiras do seu adversário, para que
essa manobra estratégica seja crível, e não seja percebida como “jogada
eleitoreira”.
Em segundo lugar, é preciso roubar parte da agenda sem entretanto
tornar-se igual ao seu adversário. Ou seja, firmar-se como uma síntese que
preserva o seu eleitorado, e rouba a parcela do seu opositor que pode lhe levar
a vitória.
Juliano Corbellini