terça-feira, 25 de maio de 2010
Campanhas online darão o tom das próximas eleições?
Por Bruno Hoffmann*
Segundo pesquisas recentes, pelo menos um terço dos brasileiros está conectado na rede mundial de computadores; nos últimos cinco anos, crescemos 30% nesse quesito; somos líderes mundiais em tempo médio gasto na Internet; temos oito aparelhos celulares para cada 10 habitantes. E você ainda acredita que a Internet, que as novas mídias, não são de grande importância?
No último ano, temos sido bombardeados, de maneira incessante, pela história de êxito da campanha presidencial de Barak Obama, com seus milhões arrecadados via Internet. De preferência, as narrações vêm sempre acompanhadas de inúmeros dados estatísticos -- enormes --, mas sem nenhuma base de comparação com eleições passadas. E o pior, sem nenhum estudo prático do que poderemos ver no Brasil já em 2010.
É hora de deixar o momento Obama passar e toda essa corrida de “especialistas em redes sociais 2.0” para percebermos que, nesse caso, existiu uma forte estrutura estratégico-tecnológica. Por esse motivo, nos próximos parágrafos, será apresentada uma análise de como se estrutura uma campanha política online, mostrando um pouco de análise e estratégia política, além de um detalhamento das indispensáveis tecnologias para a realização de uma campanha profissional – sem ultrapassar os limites do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Neste novo cenário, não há mais espaço para o modelo de website tipo “panfleto eletrônico”, no qual só se divulgam informações com zero de interatividade com o eleitor.
Por dentro de uma campanha online.
Pontos estruturais:
O primeiro passo é fazer um diagnóstico completo dos principais fatores que influenciam uma campanha: o candidato; o ambiente; e os recursos. Analisaremos um a um.
1) O candidato: quem é o seu candidato? Ele usa e-mail? Tem familiaridade com a Internet? Conhece a dinâmica? Qual a presença atual do candidato na Internet? Ele possui um website? Usa as redes sociais? Qual a sua aceitação entre os internautas? Possui um networking com 'blogueiros' e jornalistas de sites noticiosos?
Essas são as primeiras informações que devem ser levantadas.
É importante que o candidato entenda o processo e tenha um envolvimento o mais próximo possível – pois os internautas são capazes de facilmente identificar se um Twitter, por exemplo, é feito por ele ou por sua assessoria. E assim também funciona em relação à campanha, por exemplo, se o candidato não acreditar na Internet, as pessoas que ali trabalham a sua imagem não receberão a importância que merecem e o resultado a ser alcançado pode ser prejudicado.
2)O ambiente: aonde a campanha acontecerá? Onde está a base eleitoral desse candidato? Existe um número considerável de usuários da Internet? Existe um histórico de engajamento online? Pessoas já se mobilizaram usando a Internet em prol de alguma causa – seja política ou não? Existe algum projeto governamental de inclusão digital ou mesmo um alto índice de lan houses na região? Algum tipo de análise comportamental desses usuários (qual o seu principal uso na Internet?). E em relação ao partido, existe uma presença forte? E claro, os concorrentes: qual análise se pode fazer deles na Internet? Essa outra leva de perguntas trará respostas básicas sobre o ambiente de trabalho para que se possa estruturá-lo da melhor forma possível, sendo capaz de dosar as expectativas.
3) Os recursos: para se montar uma estrutura política online, de maneira profissional, em campanhas de porte significativo (que busquem pelo menos 10 mil votos), é necessária a criação de um website de campanha que, além de todas as informações sobre o candidato, deve possuir também uma estrutura mínima de tecnologia, detalhada a seguir.
- E-mail marketing: este será o seu principal meio de comunicação com o eleitorado, uma plataforma de envio de e-mail em massa será necessária para que o candidato possa informar e interagir com a sua base.
- CMS: (do inglês, Content Management System) é uma plataforma de gestão de conteúdo, que fará com que seja muito fácil e rápido adicionar e/ou editar qualquer conteúdo do wesbite. Seu uso não exige mão-de-obra especializada e oferece a dinâmica necessária a uma campanha política, na qual o website deve estar sempre atualizado e com a capacidade de ser alimentado a todo instante, sem treinamentos rigorosos.
- CRM: (do inglês, Constituent Relationship Management) é basicamente uma plataforma de gestão de apoiadores, ou seja, tem a capacidade de gerenciar um amplo banco de dados. O grande benefício do CRM em uma campanha política é a capacidade de segmentação, pois uma vez que temos um internauta cadastrado na campanha, podemos manter registrados inúmeros dados, como o número de vezes que cada usuário visitou o website, o número de e-mails de campanha lidos pelo eleitor e, até mesmo, suas contribuições no website, doações e voluntariado. Desta maneira, ganha-se uma poderosa ferramenta de segmentação, por exemplo: poderíamos buscar usuários que tenham lido 70% dos e-mails enviados e que já tenham feito uma doação e/ou se voluntariado; assim, sabe-se, portanto, que se trata de um grupo seleto que está realmente acompanhando a campanha. Esses indivíduos devem ser tratados de maneira diferente do grupo em geral, devemos dar missões especiais, devemos dar mais poder de ação para aqueles dedicados.
- Monitoramento: este é o ponto de aprendizado, todas as ações, mudanças no website, artigos que tenham tido destaque, intenso número de visitantes chegando ao website da campanha por uma mesma fonte, uma maior movimentação em uma determinada rede social, um blog que esteja fazendo campanha a favor ou contra que tenha influência; esses são exemplos do que deve ser observado durante a campanha, de maneira que possamos aprender cada vez mais sobre o meio e seus principais atores, estabelecendo, então, uma estratégia específica para cada ocasião.
Essas são as quatro estruturas básicas que uma campanha política online deve possuir, mas, claro, elas precisam também do recurso pessoal para gerenciar toda essa atividade. O importante, neste momento, é ter certeza de que as pessoas que ali estejam não sejam apenas de confiança, mas que de fato sejam “pessoas digitais”, que estejam submersas nesse meio, pessoas que estejam construindo o seu capital social na rede e sejam familiares com as redes sociais e a linguagem apropriada para cada uma delas.
Escolha da estratégia
O segundo quesito é em relação ao interesse pela política, sem uma equipe com total disposição e dedicação, que tenha de fato tesão pela campanha eleitoral, ficará difícil sobrepor seus concorrentes. Nesse ponto, já com uma análise completa do candidato, ambiente da campanha e dos recursos disponíveis, a estratégia pode começar a ser montada. O primeiro passo é buscar o reposicionamento da presença e da imagem do futuro candidato na rede. Sim, futuro candidato, este trabalho pode e deve ser iniciado bem antes da campanha eleitoral de fato. Nada lhe impede de se comunicar com a população por meio de um website, um canal no YouTube e um perfil no Twitter, por exemplo, nos quais se destaque o seu trabalho e se busque notoriedade. Tomando as devidas precauções para que não incitem uma campanha política fora de época, o candidato só tem a ganhar.
Nesta fase de definição do eixo comunicacional, é importante definir quais os principais assuntos que serão trabalhados. Com quais temas o candidato tem maior familiaridade? Por quais ele tem trabalhado mais? Quais assuntos melhor se adaptam a que o seu público vê como prioridade? Tudo isso faz parte do desenvolvimento da mensagem do candidato que, quanto mais verdadeiro e próximo aos eleitores, mais adesões sua campanha terá. Adesões é igual a banco de dados, e banco de dados bem gerenciado é igual a relacionamento, que quer dizer mais apoiadores, mais participação, e até mesmo mais voluntariado, contribuições financeiras, e claro: votos.
Como se vê, a estrutura comunicacional e o pensamento estratégico de uma campanha online não se diferem muito de uma campanha tradicional. E mais uma prova disso é que podemos comparar o comitê de uma campanha com o seu website. Vejamos, em ambos os casos, o interessado ou apoiador vem até o candidato, seja fisicamente, no comitê, em busca de informações e materiais da campanha; seja digitando o endereço eletrônico do website também para se informar e se engajar.
São nesses ambientes que surgem a oportunidade de conhecer, entender e até mesmo registrar o eleitor, guardando as informações em um bloco de notas para contato posterior como ter o apoiador se cadastrando e dando mais informações no website – com tudo armazenado no CRM. Tanto no comitê como no website se tem total controle da mensagem, ou seja, não há interferência de outros candidatos ou rumores falsos circulando. E em ambas as estruturas, busca-se organizar e ativar o relacionamento de eleitores em prol da campanha.
É importante salientar que, de fato, quanto maior a campanha maiores as possibilidades e oportunidades de se criarem impulsos capazes de mudar a história de campanhas. Mas se engana aquele que pensa que a Internet só fará a diferença nas grandes cidades e para os candidatos majoritários com maior base partidária. A maioria dos internautas busca beneficiar aqueles que realmente acreditam, isso explica o porquê de pessoas públicas, como a senadora Marina Silva, terem uma imagem e um apoio tão diferente do senador José Sarney, por exemplo (basta dar um “Google” em cada um deles). Eles representam símbolos diferentes: de um lado, se vê o novo; de outro, o continuísmo. Esses símbolos também estão ligados à transparência, a causas sociais, à acessibilidade que certos políticos disponibilizam a seus representados, as histórias de ativismo que tanto cativam os jovens e ganham o respeito dos mais experientes.
Esses símbolos fazem parte da cultura colaborativa da Internet, uma “cultura do bem”. É por isso que candidatos que demonstrarem ter sua imagem e sua história mais próximas a esses conceitos, mais terreno ganharão em uma campanha na Internet.
Fica claro que a Internet tem um potencial enorme e feliz será aquele candidato que conseguir juntar o discurso correto em um ambiente favorável com o leque de recursos tecnológicos e de pessoal para criar a repercussão e o movimento necessário para ver a Internet se estabelecendo como um meio imprescindível para sua vitória. É possível.
* Bruno Hoffmann é mestrando em Gerenciamento Político pela Graduate School of Political Management da The George Washington University. Atua na implementação de estratégias de comunicação online em campanhas eleitorais nos Estados Unidos e no Brasil